Decisão britânica de fechar agência espacial parece chocante, mas faz sentido

Tecnologia

O governo britânico anunciou, no dia 20 de agosto, que a Agência Espacial do Reino Unido (UKSA) seria incorporada ao Departamento de Ciência, Inovação e Tecnologia (DSIT). Apesar de parecer chocante, a mudança — que deve ser concluída até abril de 2026 — não pegou de surpresa funcionários da agência.

De acordo com o anúncio oficial, a incorporação da UKSA ao DSIT tem o objetivo de “otimizar o suporte à crescente indústria espacial britânica”.

“Pessoas e empresas em todo o Reino Unido se beneficiarão de novas mudanças que farão com que a Agência Espacial do Reino Unido se torne parte do DSIT — eliminando a duplicação, reduzindo a burocracia e colocando a responsabilidade pública no centro da tomada de decisões”, informou o governo em comunicado.


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O Departamento de Ciência já fornecia o financiamento da agência espacial desde 2023, e a fusão também foi vista como parte de uma iniciativa do governo para cortar gastos públicos em até 15% até 2030.

Agência espacial como “figurante”

Uma fonte interna da UKSA, que conversou sob condição de anonimato com o Space.com, afirmou que, desde 2020, o DSIT começou a argumentar que a agência espacial estava se isolando e não compreendia mais as necessidades de outros departamentos do governo.

“Percebeu-se que a agência havia se tornado uma espécie de figurante, uma defensora do conceito de espaço, em vez de pensar no que realmente precisamos do espaço para o meio ambiente, transporte, defesa etc.”, destacou a fonte ao site.

Uma das críticas recorrentes do governo se refere à abordagem espacial do Reino Unido, que dedica mais de 80% dos recursos do setor à Agência Espacial Europeia (ESA), em vez de focar no desenvolvimento de um programa espacial nacional robusto.

A ESA é uma entidade intergovernamental independente da União Europeia e, por isso, está isenta de controles governamentais diretos — diferente do que ocorre com a NASA, por exemplo.

O Reino Unido é atualmente o quarto maior contribuinte orçamentário da agência europeia, ficando atrás apenas de Alemanha, França e Itália.

Agência Espacial do Reino Unido
Agência Espacial do Reino Unido era vista como “figurante” no governo britânico (Divulgação/UK Sapce Agency)

Reavaliação da relação com a ESA

Essa relação começou a ser questionada em 2021, quando uma revisão recomendou que o governo adotasse medidas para obter mais controle sobre seus investimentos espaciais.

Além disso, a revisão orientou que o desenvolvimento da estratégia espacial nacional fosse retirado da UKSA e transferido para o Departamento para Negócios, Energia e Estratégia Industrial (BEIS, na sigla em inglês), antecessor do DSIT.

Um outro relatório, realizado pelo Escritório Nacional de Auditoria e publicado em 2024, constatou falhas de monitoramento e avaliação no andamento de projetos sob responsabilidade da UKSA. O documento também apontou que a agência não conseguiu garantir o retorno integral do investimento feito na ESA.

Outra fonte anônima revelou ao Space.com que a decisão de integrar a UKSA ao DSIT foi consequência dessa revisão e já era uma medida esperada.

Funcionários da agência também consideraram que faz sentido unir em um só setor todos os órgãos envolvidos na agenda espacial, principalmente porque há algum tempo o DSIT já fornecia os recursos financeiros à UKSA.

“Não acho que seja algo ruim, porque o DSIT é o departamento que já dá todo o dinheiro à agência espacial. A agência manterá sua marca, mas passará a se reportar ao chefe do DSIT e não pedirá dinheiro diretamente ao governo”, pontuou a fonte.

Críticas à mudança na UKSA

Outras fontes consultadas, no entanto, foram mais críticas às mudanças anunciadas. Um dos motivos foi o fato de a alteração ter sido divulgada apenas três meses antes da próxima reunião do Conselho de Ministros da ESA, que definirá a base para os investimentos dos próximos três anos.

Também há críticas ao fato de que países que buscam se posicionar fortemente no setor espacial contam com agências nacionais autônomas dedicadas exclusivamente a isso, como o Centro Nacional de Estudos Espaciais da França (CNES) e o Centro Aeroespacial Alemão (DLR).

Há ainda o temor de que a incorporação da UKSA ao DSIT resgate problemas do antigo Centro Espacial Nacional Britânico (BNSC), que antecedeu a agência atual e não possuía orçamento independente nem poderes efetivos para fomentar a indústria espacial do país.

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